Vítimas de armas de projéteis múltiplos: análise de 56 necropsias forenses


Resumo

Lesões por projéteis de armas de fogo (AF) apresentam grande importância criminalística e médico-legal. O Brasil é o país com maior número absoluto de mortes violentas e a maioria dos homicídios nacionais envolve o uso de AF. A munição típica de uma AF de projéteis múltiplos (PM) dispara um número variável de projéteis, o que ocasiona particularidades nas lesões observadas. Este trabalho objetivou analisar os casos fatais decorrentes de AF de PM necropsiados no Instituto Médico Legal André Roquette entre 2006 e 2012. Foi realizado um estudo transversal com 56 laudos de vítimas fatais de lesões produzidas por PM. Predominou o sexo masculino (98,2%), a faixa etária de 18 a 29 anos (44,6%), solteiros (83,9%), os pardos (69,6%) e naturais de Belo Horizonte. A idade média foi de 28,3 anos. A suspeita de homicídio representou a quase totalidade dos casos (96,4%), com dois casos de suicídio e nenhum de acidente. Houve predominância de vias púbicas como locais de procedência dos periciados (66,1%). A média de lesões de entrada de PM foi de 1,5. Houve lesões encefálicas em 62,5% dos casos, pulmonares em 48,2% e cardíacas em 26,8%. A média de projéteis recuperados foi de 5,7; foram encontradas buchas em 33 casos. Quase metade dos periciados havia consumido álcool etílico previamente à morte e a maioria das pesquisas toxicológicas foi positiva (cocaína e/ou maconha). Estes dados contribuem para o melhor delineamento do perfil epidemiológico das vítimas fatais de PM em nosso meio, podendo contribuir para o melhor conhecimento destas ocorrências.


Palavras-chave

Projéteis múltiplos. Espingarda. Lesões por tiro. Necropsia. Medicina Legal.

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Copyright (c) 2021 Revista Brasileira de Criminalística

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Autor(es)

  • Polyanna Helena Coelho Bordoni,
  • Giovanna Carvalho Silva,
  • Leonardo Santos Bordoni,
  • Polyanna Helena Coelho Bordoni

    Instituto Médico Legal André Roquette (IMLAR), Polícia Civil do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte (MG), Brasil

    Médica formada pela UFMG (2010) e especialista em Medicina do Trabalho pelo Hospital das Clínicas da UFMG (2013). Médica Legista da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais (2014) e Médica Perita / Médica do trabalho da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais (2013).

    Giovanna Carvalho Silva

    Faculdade de Medicina de Barbacena (FAME-FUNJOB), Barbacena (MG), Brasil

    Leonardo Santos Bordoni

    Instituto Médico Legal André Roquette (IMLAR), Polícia Civil do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte (MG), Brasil. Faculdade de Medicina de Barbacena (FAME-FUNJOB), Barbacena (MG), Brasil. Faculdade da Saúde e Ecologia Humana (FASEH), Vespasiano (MG), Brasil. Escola de Medicina, Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto (MG), Brasil.

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